Vertismed Brasil | Estudo Comentado amélia: ÁCIDO HIALURÔNICO NA OSTEOARTRITE DE JOELHO

Estudo Comentado amélia: ÁCIDO HIALURÔNICO NA OSTEOARTRITE DE JOELHO

Tiempo de lectura: 5 minutos

DR. GUSTAVO CONSTANTINO DE CAMPOS - CRM-SP 112.058

Doutor em Ciências pela Faculdade de Medicina da USP; médico contratado do Departamento de Ortopedia – UNICAMP; coordenador do Programa de Tratamento de Artrose do Instituto Wilson Mello

Introdução

Atualmente, existe certa polêmica e intenso debate entre os mais importantes guidelines de tratamento de osteoartrite dos joelhos, com visões diferentes entre os diversos grupos de especialistas, especialmente no tocante à medicação condroprotetora e à viscossuplementação . Apesar da polêmica, a literatura é robusta em relação aos resultados positivos na dor, função e qualidade de vida obtidos com a viscossuplementação. Com mais de uma centena de artigos publicados anualmente nos últimos dez anos, as principais metaanálises do assunto apontam para um início de ação lento (benefício em relação ao placebo apenas após três a quatro semanas), pico de ação ao redor de oito semanas e bons resultados observados até seis meses ou, como na série apresentada no presente estudo, até um ano.

O presente artigo é sobre o projeto AMELIA (OsteoArthritis Modifying Effects of Long-term Intra-articular Adant), que foi desenhado para comparar contra placebo a eficácia e a segurança de repetidas injeções intra-articulares de ácido hialurônico, além do seu efeito sobre a evolução da osteoartrite em um período longo de 40 meses. Esse estudo oferece evidência pioneira de que repetidos ciclos de injeção intra-articular de ácido hialurônico não apenas melhoram os sintomas da osteoartrite no período entre ciclos como exerce um importante efeito sustentado, que dura pelo menos um ano após o último ciclo.

o projeto

O estudo AMELIA foi um ensaio clínico prospectivo, randomizado, com pacientes e avaliadores cegos, controlado por placebo, ou seja, o desenho de estudo que oferece o maior nível de evidência possível dentro dos parâmetros da medicina baseada em evidência. Foi um estudo multicêntrico que contou com o expressivo número de 306 pacientes com osteoartrite de joelho. Os pacientes foram então aleatoriamente divididos em dois grupos de 153 pacientes para receber a injeção intra-articular de 2,5ml de hialuronato de sódio biofermentado ou a injeção intra-articular de 2,5ml de solução salina (placebo). As injeções foram oferecidas em ciclos de cinco aplicações semanais (uma aplicação por semana durante cinco semanas). Foram realizados quatro ciclos, sendo que entre o primeiro e o segundo ciclo e entre o segundo e o terceiro ciclo passaram-se seis meses, entre o terceiro e o quarto ciclo passaram-se 12 meses, e os pacientes foram, ainda, acompanhados por mais 12 meses, o que totalizou 40 meses de acompanhamento, um seguimento extremamente longo. Os pacientes tinham, pelo menos, 45 anos e um grau de artrose de II ou III, segundo a escala de Kellgren and Lawrence (artrose leve e moderada, respectivamente). O espaço articular medial era obrigatoriamente maior que 2mm. Os pacientes tinham que ter um nível de dor de, no mínimo, 55mm na escala visual analógica (EVA), que vai de 0 (sem dor) a 100mm (maior dor possível). O desfecho primário foi a resposta aos critérios da OARSI (Osteoarthritis Research Society International) de 2004. Pacientes foram considerados como “respondedores” quando apresentaram melhora de pelo menos 50% nos questionários de função e de pelo menos 20mm na EVA. A segurança da viscossuplementação foi analisada pela incidência e tipo dos eventos adversos. 

resultados

Na consulta de 40 meses, significativamente mais pacientes responderam ao ácido hialurônico em comparação ao placebo pelos critérios da OARSI 2004 (p=0,004) (figura 1). O número de respondedores ao ácido hialurônico aumentou durante o estudo, enquanto aqueles que receberam placebo não mudaram. Diferenças significativas também foram encontradas em favor do ácido
hialurônico para cada componente individual do OARSI 2004. Nenhum problema de segurança foi registrado.

Os resultados do estudo AMELIA revelaram que ciclos repetidos de injeções intra-articulares de AH não só melhoram os sintomas de osteoartrite no joelho durante o período entre os ciclos, mas também exercem um importante efeito residual por, pelo menos, um ano após as últimas injeções. Como certamente o viscossuplemento não está mais agindo na articulação após um ano, é bastante razoável considerarmos que o efeito sintomático observado tanto tampo depois decorre de uma ação condroprotetora, ou, para utilizar um termo mais completo, uma ação modificadora da osteoartrite.

O efeito biológico da viscossuplementação é bastante demonstrado na literatura. Uma recente revisão sistemática encontrou 67 artigos na literatura que descrevem efeitos condroprotetores promovidos pela injeção intra-articular de ácido hialurônico. Existem diversos efeitos benéficos promovidos pelo ácido hialurônico, como redução da apoptose de condrócitos e aumento da proliferação de condrócitos , sendo que a maioria desses efeitos se dá pela interação com os receptores celulares CD44. Bagga et al. , em 2006, e Band et al. , em 2015, estudaram o líquido sinovial de pacientes
com osteoartrite de joelho, submetidos à infiltração com ácido hialurônico, observando uma melhora da dor e da função, provavelmente decorrente do efeito condroprotetor do aumento da concentração de ácido hialurônico nesse líquido. Trabalhos com achados mais objetivos também foram publicados. Biópsias realizadas antes e depois da VS evidenciaram, após seis meses, reconstituição da camada superficial, melhor qualidade da matriz e maior densidade de condrócitos, com maior número de organelas em seu interior . Artroscopias second look realizadas um ano após o
início do tratamento com ácido hialurônico observaram melhor aspecto visual da superfície articular em comparação com o grupo placebo. Finalmente, Jubb et al. constataram que o tratamento com ácido hialurônico, em comparação ao placebo, reduziu significativamente a progressão da perda do espaço articular em pacientes que apresentavam graus mais leves de OA dos joelhos. Assim, além das funções de substituição do líquido articular (viscossuplementação propriamente dita) e analgesia, a injeção intraarticular de ácido hialurônico pode promover importante efeito biológico tanto na modulação da atividade inflamatória quanto na promoção de uma melhora estrutural.

conclusão

Os resultados do estudo AMELIA demonstram que a viscossuplementação tem a capacidade de não apenas promover benefício sintomático no período entre ciclos, mas promover efeito residual de pelo menos um ano após a última aplicação.

Referências

1. Bruyere O, Cooper C, Pelletier JP et al. An algorithm recommendation for the management of knee osteoarthritis in Europe and internationally: a report from a task force of the European Society for Clinical and Economic Aspects of Osteopo-rosis and Osteo arthritis (ESCEO). Semin Arthritis Rheum. 2014;44(3): 253-263.
2. McAlindon T, Bannuru ER, Sullivan MC et al. OARSI guidelines for the non-surgical management of knee osteoarthritis. Osteoarthritis Cartilage. 2014;22(3): 363-388.
3. Bannuru R, Natov NS, Dasi UR et al. Therapeutic trajectory following intra-articular hyaluronic acid injection in knee osteoarthritis-meta-analysis. Osteoarthritis Cartilage. 2011;19(6): 611-619.
4. Bellamy N, Campbell J, Robinson V, Gee T, Bourne R, Wells G. Viscosupplementation for the treatment of osteoarthritis of the knee. Cochrane Database Syst Ver. 2006;(2):CD005321.
5. Divine JG, Zazulak BT, Hewett TE. Viscosupplementation for knee osteoarthritis: a systematic review. Clin Orthop Relat Res. 2007;455:113-22.
6. Navarro-Sarabia F, Coronel P et al. A 40-month multicentre, randomised placebocontrolled study to assess the efficacy and carry-over effect of repeated intra-articular injections of hyaluronic acid in knee osteoarhritis: the AMELIA Project. Ann Rheum Dis. 2011;70(11):1957-62.
7. Altman RD, Manjoo A, Fierlinger A, Niazi F, Nicholls M. The mechanism of action for hyaluronic acid treatment in the osteoarthritic knee: a systematic review. BMC Musculoskelet Disord. 2015;16:321.
8. Brun P, Panfilo S, Daga Gordini S, Cortivo R, Abatangelo G. The effect of hyaluronan on CD44-mediated survival of normal and hydroxyl radical-damaged chondrocytes. Osteoarthritis and cartilage / OARS, Osteoarthritis Research Society. 2003;11(3):208-16.
9. Brun P, Zavan B, Vindigni V, Schiavinato A, Pozzuoli A, Iacobellis C et al. In vitro response of osteoarthritic chondrocytes and fibroblast-like synoviocytes to a 500-730 kDa hyaluronan amide derivative. J Biomed Mater Res B Appl Biomater. 2012;100(8):2073-81.
10. Bagga H, Burkhardt D, Sambrook P, March L. Longterm effects of intraarticular hyaluronan on synovial fluid in osteoarthritis of the knee. J Rheumatol, 2006;33(5):946-50.
11. Band PA, J Heeter, HG Wisniewski, V Liublinska, CW Pattanayak, RJ Karia et al. Hyaluronan molecular weight distribution is associated with the risk of knee osteoarthritis progression. Osteoarthritis and cartilage / OARS, Osteoarthritis Research Society. 2015;23(1):70-6.
12. Guidolin DD, Ronchetti IP, Lini E, Guerra D, Frizziero L. Morphological analysis of articular cartilage biopsies from a randomized, clinical study comparing the effects of 500-730 kDa sodium hyaluronate (Hyalgan) and methylprednisolone acetate on primary osteoarthritis of the knee. Osteoarthritis and cartilage / OARS, Osteoarthritis Research Society. 2001;9(4):371-81.
13. Listrat V, Ayral X, Patarnello F et al., Arthroscopic evaluation of potential structure modifying activity of hyaluronan (Hyalgan) in osteoarthritis of the knee. Osteoarthritis and cartilage / OARS, Osteoarthritis Research Society. 1997;5(3):153-60.
14. Jubb RW, Piva S, Beinat L, Dacre J, GishenP. A one-year, randomised, placebo (saline) controlled clinical trial of 500-730 kDa sodium hyaluronate (Hyalgan) on the radiological change in osteoarthritis of the knee. Int J Clin Pract. 2003;57(6):467-74.

¡Haz clic para calificar esta publicación!